Eu gosto muito quando algo muito improvável se torna sucesso no futebol. Aliás, costumo brincar que, no tão popular esporte bretão, uma das poucas lógicas do futebol é que ele é ilógico.
Na história, vimos um jogador muito comum, que praticou a condenável tática do “gato”, tornar-se o maior treinador estrategista do Brasil nos anos 90: Luxemburgo. Tivemos um “central botinudo”, que quando começou como treinador tinha um estilo de futebol totalmente “anti-brasileiro” de jogar feio e matar com faltas as jogadas adversárias, que foi campeão do mundo com o inimaginável 3-5-2: Scolari. Presenciamos a Grécia ser campeã da Europa e o Brasil apanhar de 7×1 em plena Copa do Mundo local. Coisas que somente o futebol permite.
Agora, guardadas todas as proporções de competência mas trazendo à tona todas as verossimilhanças do inusitado, temos a boa revelação do desconhecido atual treinador do Paulista FC: Edson Ferreira da Silva, conhecido no mundo da bola como “Edson Fio”.
Vamos lá:
1- Quantos treinadores negros você tem fazendo sucesso no futebol brasileiro (de tantos criolos maravilhosos que tão bem representaram a arte em campo)? Lula Pereira, Serginho Chulapa e Cristóvão Borges me são lembrados, mas… nenhum efetivamente se destacou com títulos. Não abordando o racismo propriamente dito, mas, estatisticamente, ser técnico negro “ganha menos campeonato no Brasil”. Fio é negro e o atual líder do Paulistão da Segundona (a 4a divisão).
2- Na onda de treinadores bem vestidos à beira do campo e com postura elegante (esqueça Sampaoli, ele é louco como Bielsa), temos “professores” que se portam como num casamento à beira do gramado com suas camisas bonitas de marca chique (nada contra isso). Mas Fio fica na área técnica de camiseta e bermuda esportiva, sem vergonha da barriga saliente, e é compreendido pelos seus comandados.
3- Enquanto os treinadores, na sua maioria, preocupam-se em primeiro não perder para depois ganhar (vide Carille, Felipão e tantos outros), sem se importar com a beleza do jogo, buscando o pragmatismo defendido por Carlos Alberto Parreira na década de 90, Fio é proativo, coloca o time no ataque sem ser Guardiola ou Fernando Diniz, sem ter a mesma qualidade técnica dos atletas que esses grandes treinadores tem (afinal, estamos falando da 4a divisão que é limitada a jogadores Sub 23). O “jogo jogado” do Galo da Japi é agradável para assistir, não retranqueiro nem faltoso (era o time mais Fair Play da competição até determinada rodada), e que vem obtendo sucesso: 5 Vitórias, 2 Empates e 0 Derrotas, com a melhor campanha entre os 41 clubes e o segundo melhor saldo de gols.
Impossível não fazer a observação: tentar jogar bonito, mesmo sem ter jogadores renomados, é possível independente da divisão. Ao menos, vale o ingresso pago. E o resultado pode ser esse como visto.
Voltando ao Fio: tudo isso que foi escrito serve para fazer uma justa consideração para o então desconhecido treinador. Quando veio do Rio Branco de Americana para o Paulista de Jundiaí através da Kah Sports / Fut Talentos (o grupo que terceirizou o futebol tanto profissional quanto amador do Galo), ambos estavam sob desconfiança! Aqui, sem o entendimento pejorativo, pois os resultados do Tigre com o Fio eram péssimos e o medo de “quem é a Kah Sports?” era natural, já que o clube jundiaiense estava arrebentado financeira e emocionalmente, após ruins campanhas e parcerias que foram golpes (lembram do grupo monegasco do português Paulo Fernandes?).
Hoje, não só a parceira tem trabalhado bem, como Fio pode mostrar seus conhecimentos. Erra em uma ou outra substituição (como todo treinador erra), mas é fiel a seu conceito de futebol com intensidade (veja como se porta o time sufocando o adversário nos minutos iniciais). Possui a flexibilidade de mudar o estilo de jogo conforme o desenrolar dos 90 minutos decorre e/ou a leitura da partida mostra.
Sabe o que trouxe um pouco de antipatia na chegada do Edson Fio (e que hoje se dissipou?) A história real de que queria ser chamado de Fyu, com uma certa pompa que nunca me pareceu dele. Pura bobagem. Passou.
Assim, lembremo-nos: aquele Edson Fio que chegou tão contestado pelo histórico de jogos (o site Esporte Jundiaí fez um ótimo trabalho de apuração sobre os resultados e a história dele, retratados com uma análise de quem conhecia o repertório de ideias na sua passagem no co-irmão do Interior, em: https://bit.ly/2whS5Vj, e que hoje, com bom material humano e mais experiência, conseguiu mudar as estatísticas), passou a ter a confiança do torcedor.
Enfim: conversei apenas, e bem informalmente, uma vez com Fio e na porta do estádio. Me pareceu autêntico, boleirão, simples. E isso é… ótimo! O anti-marketing (ou melhor: desprovido de marketing) que faz sucesso.
Apenas para reforçar tudo isso, vale pensar: qual treinador negro, que joga para frente, que não se preocupa em auto-promoção, que se veste tão simples / sem vaidade, lidera um certame qualquer?
IMPORTANTE: não pense, após tudo isso, que ele não seja um estudioso do futebol (simplicidade não é sinônimo de burrice). Ou as mudanças e a vontade do “jogo-moderno” não mostram que esteja atualizado com os conceitos tão discutidos nas mesas-redondas?
Neste momento, acho justo tal reconhecimento a ele.

Foto: Esporte Jundiaí

[…] respeitosa ao técnico Edson Fio (bem a vontade para tal, pois o elogiei nesta publicação: https://professorrafaelporcari.com/2019/05/24/discutindo-edson-fio-o-treinador-sem-marketing-que-vem…), a respeito da saída do lateral Victor […]
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[…] respeitosa ao técnico Edson Fio (bem a vontade para tal, pois o elogiei nesta publicação: https://professorrafaelporcari.com/2019/05/24/discutindo-edson-fio-o-treinador-sem-marketing-que-vem…), a respeito da saída do lateral Victor […]
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