Quando ouvimos falar de termos como solada, pé-alto, perna erguida e outros, lembramo-nos de pronto de “lance ilegal no futebol”. Mas será que isso realmente procede?
Vamos lá: tecnicamente, falamos em “jogo perigoso”. Se um atleta disputar a bola com a perna erguida, por exemplo, pode atingir um adversário e lesioná-lo. Se não atingir, o árbitro deve marcar tiro livre indireto, sem aplicação de cartão. Se atingi-lo, deve marcar tiro livre direto (não se pune com cartão, caso entenda que foi uma ação imprudente; aplica-se cartão amarelo, caso entenda-se jogada temerária; expulsa-se com o cartão vermelho, caso entenda força excessiva). Há ainda outra situação: quando dois atletas não se percebem, trombam e caem – aí é acidente de trabalho ou simplesmente casualidade, não ocorrendo infração.
Mas o grande problema é: como entender se uma perna erguida é ou não jogo perigoso?
Li alguns comentários de torcedores querendo diferenciar uma disputa de bola com o bico da chuteira ou com a sola. Na verdade, o que se deve avaliar, independente de qual parte do pé: o risco de lesão.
Para fazer a avaliação, o árbitro deve considerar alguns fatores:
- a- A bola está em que altura?
- b- As pernas do jogadores estão erguidas ou não? Importante: um jogo perigoso pode ocorrer também no chão, com uma disputa de atleta que pratique um carrinho que atinja a bola com as travas, mesmo não atingindo o adversário.
- c- Há disputa de bola ou o jogador está sozinho, sem levar risco a alguém?
- d- A que distância os atletas estão para a disputa de bola?
O LANCE DE SÃO PAULO x CORINTHIANS, especificamente:
Na partida de ontem, a bola sobra para Alexandre Pato que está com a perna erguida. Já ter dominado ou não a bola será irrelevante para essa análise, já que a ação praticada na disputa deve ser levada em conta, e não o domínio efetivo. Ato contínuo, Rogério Ceni, que estava na disputa, chuta o pé do atleta corinthiano.
Vamos lá: se a bola estivesse no chão e ambos estivessem a disputando, logicamente pênalti inconteste e as nuances citadas não devem ser levadas em conta. Mas com a bola no alto, vale discutir:
1- Pato levanta a perna numa distância segura para disputa-la, ou, por estar em velocidade, deveria ser mais prudente e tomar cuidado para não levar risco ao goleiro são-paulino?
2- Rogério Ceni tenta atingir a bola e foi imprudente ao chegar atrasado e atingir o adversário, ou só o acerta pois a perna estava ainda levantada?
3- O principal ponto de discussão: Pato está com a perna erguida a uma distância segura ou não de atingir Rogério Ceni? E aqui você tem duas possibilidades, sendo que ambas são coerentes à Regra do Jogo:
3.1- Se você entende que a distância era suficiente para que Pato pudesse dar uma solada, ou toque, ou patada (não importa como) para tentar o domínio (independente se dominou ou não), então Pato não cometeu ilegalidade alguma e o chute de Rogério Ceni foi falta. Sendo na área, pênalti.
3.2- Se você entende que a distância era insuficiente para que Pato tentasse o domínio com segurança, então nesse instante deve-se marcar tiro livre indireto a favor do São Paulo FC, e a partir desse momento o jogo já está paralisado. Se Rogério Ceni o atingir ou não, não se pode marcar infração pois a partida estava parada (ou seria paralisada, caso o árbitro não tenha tempo de apitar o lance) por jogo perigoso. O pé alto precedeu o chute. Tal lance é como “pênalti em impedimento” – se um atleta está em impedimento, recebe a bola e antes do bandeira erguer seu instrumento o atacante sofrer uma falta do zagueiro, deve-se marcar tiro livre indireto contra a equipe do atacante, pois a partida já não valia mais no momento do chute do zagueiro (entretanto, devido a força do chute, o atleta pode receber a punição disciplinar e, curiosamente, até ser expulso com tiro livre a seu favor!)
Como se vê, as duas possibilidades explicadas em 3.1 e 3.2 serão escolhidas única e exclusivamente pela interpretação. O lance é difícil e não há absurdo na decisão ser uma ou outra.
Particularmente, entendi que houve infração de Pato; mas a outra decisão também é respeitável, como pudemos estudar.
O que não pode é relatar o lance como está na súmula do jogo: Segundo o árbitro, Rogério Ceni foi punido por “calçar o adversário”. Aí, não há imagem que mostre tal calço…
Sobre a análise da arbitragem da partida São Paulo 1 x 2 Corinthians, visite o link do Jornal Bom Dia / Diário de São Paulo, em:
http://www.redebomdia.com.br/blog/detalhe/18720/Analise+da+Arbitragem+de+Sao+Paulo+x+Corinthians
Ou no Blog Pergunte ao Árbitro:
Ou ainda no Blog de Contemporaneidades do prof Rafael Porcari: http://professorrafaelporcari.blog.terra.com.br/2013/03/31/empate-em-erros-capitais-na-vitoria-corinthiana/
E no lance acima, o que fazer?

Pronto, professor, fechou! Também entendi que houve “infração do Pato”! Se já achava em comentário meu anterior (aparentemente precipitado), agora não resta, para mim, dúvida. Ótimos esclarecimentos.
Valeu Matias, vc é um cara coerente. Fique tranquilo quando quiser discordar, o futebol é assim mesmo. Um abração, e parabéns pela ótima coluna. Porcari
CurtirCurtir