Muito bom o texto do jornalista Heitor Freddo sobre jogadores que, como promessas, têm oportunidades e se perdem. Outros, labutando em meio as dificuldades, agarram a primeira e única chance com unhas e dentes.
Vale a pena conferir:
Extraído de: https://heitorfreddo.wordpress.com/2016/05/31/de-lucas-perdomo-a-rodrigao/
DE LUCAS PERDOMO A RODRIGÃO
Ontem a palavra futebol entrou no noticiário policial com a prisão de Lucas Perdomo, jogador do Boavista suspeito de participar de um dos crimes mais assustadores dos últimos tempos – o estupro coletivo de uma adolescente de 16 anos.
Enquanto boa parte da sociedade ainda tenta encontrar uma brecha para culpar a vítima – comportamento típico da cultura do estupro que vigora no país -, pouco se discute sobre o que leva um ser humano a ter uma atitude tão nojenta. Nesse caso específico, estamos falando de uma das profissões mais badaladas na hora de encontrar uma parceira.
Um jogador de 20 anos apadrinhado pelo mega astro Seedorf. Atleta do Boavista, mas observado por outros clubes como o Audax em São Paulo e o Botafogo no Rio de Janeiro.. Uma vida jogada no lixo por culpa única e exclusiva dele. Não digam que foram as más companhias, porque ele não estava obrigado naquele quarto. Não tratem como uma armação, porque foram os estupradores quem filmaram e espalharam o vídeo de uma menina desacordada na cama enquanto eles (incluindo o jogador Lucas) passam as mãos nas partes íntimas dela – se você não sabe, isso já é um estupro.
Mas no mesmo dia em que o futebol perdeu um jogador promissor, preparado desde criança para ser atleta de alto rendimento, uma história exatamente oposta desse esporte veio à tona. Um caminho de superação, força de vontade, determinação e a realização de um sonho. Uma carreira construída sem ajuda de ninguém e sem nenhuma perspectiva de sucesso.
Em 2013 Rodrigão era um atacante de futebol amador. Com porte físico de centroavante, o rapaz de 19 anos era estrela nos campos de várzea da Bahia. Uma diversão aos finais de semana para quem ganhava a vida trabalhando como pintor de paredes.
É óbvio que desde menino, Rodrigão sempre sonhou em ser jogador profissional. Mas como apostar nesse sonho e viver fora de casa quando desde criança você é um dos responsáveis por garantir o sustento da família e o pagamento do aluguel?
A diversão do final de semana falou mais alto. Em 2013 olheiros do Democrata de Governador Valadares em Minas Gerais descobriram Rodrigão jogando no futebol amador da Bahia e o convidaram para um teste no clube. Eu juro que eu queria esses olheiros para o meu time.
Rodrigão se profissionalizou, foi contratado pelo Boa Esporte (a quarta força do futebol mineiro) e esse ano foi vendido ao Campinense da Paraíba, onde em menos de 5 meses se tornou o maior goleador do país com 18 gols que levaram o Campinense a mais uma final estadual.
Três anos depois do inesperado convite no futebol amador, Rodrigão é o novo reforço do Santos Futebol Clube. O jovem pintor de paredes vai vestir uma das camisas mais importantes do futebol mundial. E na sua chegada, deixa claro qual seu principal objetivo. Não é fazer fama, nem comprar um carrão de luxo ou ser fotografado pelo Ego aos beijos com uma Panicat. Rodrigão que comprar uma casa própria para a família e ter a segurança de que, se o sonho do Cinderella de chuteiras for interrompido, a carreira não terá sido em vão.
Impossível não lembrar da história de outro guerreiro da bola. Grafite, o artilheiro do Campeonato Brasileiro pelo Santa Cruz, começou a carreira de jogador de futebol aos 21 anos. Antes, Edinaldo era vendedor de sacos de lixo de porta em porta e jogava por prazer no futebol amador aqui da nossa região. Assim nasceu um campeão da Libertadores, campeão e ídolo na Alemanha, jogador de seleção brasileira em Copa do Mundo e maior ídolo da história do Santa Cruz.
São histórias assim que fazem as esperanças serem renovadas no futebol. Numa época de jogadores mimados, blindados por todo tipo de assessor e parte da geração mimimi, temos ainda atletas que brilham os olhos ao receberem um convite de um clube grande. Numa fase de atletas preocupados com o status nas redes sociais, ainda temos guerreiros que sonham com uma casa própria.
Numa época de Lucas Perdomo, que bom que ainda temos Rodrigo.




