Que decepção em relação ao Guilherme Afif Domingos. Achava-o sério, até criar o cargo de “Coordendador da Coordenação da Coordenadoria-Geral”.
Lamentável o descaso com o dinheiro público. Abaixo:
Extraído de: Revista Época, ed 804, pg 46-47
O MINISTÉRIO MAL-ASSOMBRADO
Por Leandro Loyola
Um dia recente e sombrio em Brasília, um dos elevadores do Bloco O da Esplanada dos Ministérios estava parado no térreo, com a porta aberta e manchas de sujeira no chão e nas paredes. Não havia viva alma ali dentro. Uma servidora olhava, mas não tinha coragem para entrar. Estava com medo. Apertou o botão para chamar um dos outros dois elevadores, cujos visores estavam apagados, e cujas portas estavam fechadas. “Não confio nesse aí”, disse. Duas semanas antes, o elevador sujinho levava um grupo de funcionários quando, súbito, desceu rápido demais e – buuu! — parecia despencar. Ninguém se machucou. Coisas de lugares abandonados, dizem uns. Obra de fantasmas, garantem outros. Desde que o Exército desistiu daquelas lúgubres instalações, o Bloco O está quase vazio, ao menos de almas deste mundo. Consta que há sobreviventes apenas no 72 andar, onde, entre divisórias bege e carpetes, ouve-se o perturbador silêncio da burocracia brasiliense. Ali, na sala com as maiores divisórias, onde nunca se vê alguém entrar ou sair, e muito menos alguém ousa desbravar, habita, mais em espírito que em carne, o empresário Guilherme Afif Domingos, desde maio o 39fl ministro do governo Dilma Rousseff.
Afif é o chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, entregue pela presidente Dilma ao PSD de Gilberto Kassab, em troca de apoio no Congresso e nas eleições de 2014. Afif, o ministro do governo do PT, também é vice-governador do Estado de São Paulo, tocado pelo PSDB – num daqueles fatos políticos do Brasil que somente os magos do sobrenatural podem explicar. Ou, no caso, os sábios do Comitê de Ética da Presidência, que não se assustaram com o fantasma e não viram problemas em deixá-lo habitar o Bloco O. O trabalho que se faz no ministério de Afif também é transcendental. Não há nem sequer site da Pasta. A Secretaria de Comunicação, encarregada de montá-lo, afirma que a verba acabou. Com exceção, naturalmente, dos gastos públicos que financiam a fantasmagoria. Como ministro, Afif tem assessores, funcionários a comandar, salário de R$ 26.723,13 e um orçamento de R$ 61 milhões para gastar em 2014.
Afif virou ministro, mas fica pouco em Brasília. Em geral, de terça a quinta-feira – um dia a menos que a maioria dos ministros. Recentemente, nem isso. Outro dia, todos o viram, ao mesmo tempo, no gabinete. Somente na semana passada, após cinco meses, Afif reuniu todos os 70 funcionários do ministério. Como num evento, cada um se apresentou, disse de onde veio e o que faz. Quase todos os 37 atos de Afif, até agora, foram para o mear pessoal. Em 13 de agosto (toc, toc, toc), ele nomeou uma servidora para o cargo de “Coordenador da Coordenação da Coordenação-Geral de Procedimentos do Departamento de Racionalização e Simplificação” da Secretaria. Coisa do outro mundo.
ÉPOCA, qual um caça-fantasma, foi atrás de explicações racionais para a assombração do Bloco O. Eis a que foi oferecida por Afif: em 21 de agosto, três meses depois de tomar posse, ele corria tranquilamente perto do hotel onde se hospeda quando está em Brasília, quando caiu e quebrou o cotovelo direito. Voou para São Paulo, foi operado, ganhou 21 pinos no braço e, sem poder assinar documentos, emendou uma licença. Âfif só voltou
“Comecei esse ministério apenas com o CNPJ”, afirma Afif. “Leva tempo para selecionar e nomear todo mundo.” Ele costuma dizer que seu ministério “é de verbo, não de verba”. É exatamente isso que prejudica sua popularidade entre a maioria dos parlamentares do PSD. Eles gostariam que Afif se fosse, para que o partido pudesse barganhar um ministério com menos verbo, mais verbas – e mais cargos a oferecer. Isso não vai mudar. Mas em dezembro, o ministério-fantasma terá de mudar temporariamente de endereço: o Bloco O passará por uma reforma. Ainda não se sabe se algum exorcista participará dos trabalhos.
