A Folha de São Paulo trouxe uma matéria interessante (link abaixo), mostrando que a Educação Positiva, o método de educar os filhos com regras negociáveis, permitir a escolha da crianças e achar que a conversa e debate são perfeitos para a formação dos pequenos, tem muitas e perigosas falhas.
Por exemplo: o depoimento de Gabriela, mãe de uma menina de 7 anos, que relata: “(…) O espaço de fala trouxe muitos conflitos e estremeciam nossas relações. Quando percebi os malefícios, passei a questionar meu papel de mãe”. A solução, segundo a mãe, foi um trabalho para que a criança voltasse a aceitar limites.
Outra mãe, Evelyn, disse: “Chegou um ponto que eu percebi que estava debatendo demais com uma criança”!
Na verdade, o grande problema dessa metodologia é: as crianças (por serem crianças), acharem que podem desrespeitar os adultos, se sentirem capazes de tomar decisões impossíveis para a sua idade, e, pior, transgredirem em nome da não-disciplina, desobedecendo os pais.
Compartilho, extraído de: https://www1.folha.uol.com.br/equilibrio/2024/09/maes-apontam-frutos-negativos-da-educacao-positiva-e-especialistas-explicam-riscos.shtml
MÃES APONTAM FRUTOS NEGATIVOS DA APLICAÇÃO DA EDUCAÇÃO POSITIVA, E ESPECIALISTA EXPLICAM RISCOS
“Vocês viram o vídeo da mãe que fala que colheu os frutos negativos da educação positiva? Pois é, eu também colhi”, conta a assistente comercial Evelyn Faoth, 24, em uma gravação que alcançou 2,4 milhões de visualizações no TikTok em menos de um mês.
O depoimento se baseia no comportamento da filha de 4 anos. A criança, diz Evelyn, passou a debater e rebater tudo, após receber “muito poder de fala”. Um efeito colateral, acredita, de ensinamentos que passava à menina. Do “colocar a criança em posição de escolha sempre”.
“Eu comecei a acompanhar conteúdos que falavam para dar voz à criança, validar os sentimentos dela, entender o momento de uma birra, de ela bater o pé, como o emocional desregulado”, diz ela à reportagem. “Isso funcionou na minha casa por um tempo. Mas houve um efeito reverso.”
Na casa da família as regras eram negociáveis, mas na escola, não. Isso fazia com que a menina deixasse de fazer deveres quando não tinha interesse. “Chegou um ponto que percebi que eu estava debatendo demais com uma criança.”
“Isso quer dizer que odeio a educação positiva? É claro que não. Mas também não devemos colocar a educação positiva em uma bolha e dizer que tudo é perfeito, porque não é.”
O relato é semelhante ao de outras mães que afirmam colher frutos negativos do método, definido por Liubiana Araújo, presidente do Departamento Científico de Desenvolvimento e Comportamento da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), como a substituição da punição pela reflexão, “para que a criança mesmo chegue à conclusão das melhores condutas e atitudes”.
“A educação positiva significa substituir o gritar, o bater, por uma atitude de educar de forma inteligente”, afirma. “O que está acontecendo é que isso está sendo confundido. A educação positiva não é uma educação onde a criança toma as próprias decisões da sua vida. Autoridade com afeto é o melhor caminho, segundo as evidências científicas.”
O método tem sido disseminado por criadores de conteúdo no Brasil como derivado da chamada “disciplina positiva”, abordagem criada em 1981 pela psicóloga e escritora americana Jane Nelsen. “Mas ele não é derivado. Esses métodos não são sinônimos”, ressalta Jane à Folha.
A psicóloga define a disciplina positiva como o respeito mútuo e o estabelecimento de limites com firmeza e gentileza, ressaltando que a abordagem “oferece diversas estratégias comprovadas pela pesquisa para evitar tanto a permissividade quanto a punição, ajudando as crianças a aprenderem a autodisciplina e habilidades de resolução de problemas respeitosas, tanto em casa quanto na escola”.
Ela analisa, entretanto, que outros programas de educação foram criados com partes da abordagem, mas sem bases fortes nessas premissas e no que é a parentalidade, que define como “ajudar as crianças a aprenderem habilidades sociais e de vida para contribuir para um mundo melhor”.
“Eu não conheço a base filosófica da educação positiva”, diz Jane. “Mas o problema é que está gerando mais confusão do que um caminho claro para os pais. E o resultado está aparecendo nas salas de aula com as crianças, com pais confusos e professores exaustos.”
Para a psicóloga, programas que não possuem literatura científica e base psicológica, e se concentram demais no trauma dos pais, podem levar a aplicações erradas. A disciplina positiva, ressalta, requer uma mudança de paradigma e um treinamento aprofundado para implementação bem-sucedida. “Isso não pode ser ensinado de forma superficial por gurus online.”
“Não é algo que pode ser alcançado por pessoas que estão de passagem —mesmo que tenham milhões de seguidores”. Na visão de Jane, “e incrível e gratificante ver cada vez mais famílias interessadas no estilo de criação dos filhos”. No entanto, a psicóloga vê influenciadores se aproveitando da dor e da culpa dos pais.
Gabriela Martins Ferro, 28, é outra mãe que viralizou em redes sociais contando ter colhido “frutos não tão bons da educação positiva” com a filha de 7 anos.
“Eu comecei a seguir a metodologia à risca e a prática se tornou acolhê-la quando estivesse nervosa ou frustrada, dar espaço de fala para tomada de decisões que não a colocassem em risco, parar para ouvir, de certa forma negociar, deixar ela fazer coisas sozinha para ter autonomia e só ajudar quando solicitado”, diz ela.
“Mas a questão principalmente do espaço de fala nos trouxe muitos conflitos e discussões que estremeciam nossa relação como mãe e filha. Quando eu fui percebendo os malefícios de dar tanto ouvido ao que ela tinha para dizer, comecei a me questionar do meu papel de mãe.”
Na educação positiva, afirma Gabriela, o que se opõe à cartilha é visto como um potencial causador de traumas.
“E isso é horrível”, diz ela. “Hoje, sinto que tiramos algumas responsabilidades dela, começamos a fazer terapia, o que tem melhorado muito em relação ao comportamental e à aceitação de limites. Um trabalho de formiguinha, mas que tem dado resultado.” O assunto fez emergir um debate sobre a linha que separa a educação positiva da educação permissiva –e a possível falta de limites dado às crianças. O método, porém, não é sinônimo de falta de limites.
Segundo Manuela Moura, psicóloga clínica e mestre em psicologia do desenvolvimento, ” Nunca na vida educação positiva é sinônimo de falta de limites”. Segundo a profissional, o método visa explicar à criança as razões dos limites impostos, colocando o diálogo no lugar da imposição e do silenciamento.
“É claro que a educação antiga, a educação que tem a via mais autoritária, ela vem recheada de frases, ações que são produtoras de medo. Então muitas vezes a criança se cala pelo medo de ouvir um grito, uma represália, alguma reação mais explosiva”, afirma. “Na educação positiva, a base da intervenção é uma base do diálogo.”
A professora Edna Ponciano, pesquisadora do Instituto de Psicologia da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), afirma que a questão não é nova nos consultórios. “A maior preocupação é relativa ao comportamento, sobre a dificuldade de estabelecer limites”, afirma. Mas “crianças sem limites”, acrescenta, “são a consequência de diversos fatores. A educação positiva não é a causa única, mas pode atrapalhar a tarefa dos pais que se sentem culpados ou desorientados. É preciso cuidar dos pais também”.
Segundo a professora, “não é possível simplesmente encaixar as pessoas em uma receita”. É preciso descobrir o que faz sentido para a família. “A educação positiva pode ser um mapa, mas o território muda a cada relação entre pais e filhos”, diz.
Nas redes sociais, a educação positiva se espalha em definições como “revolução amorosa”. Evelyn e Gabriela concordam que existem bons frutos.
“Minha filha se tornou uma criança independente, sabe se expressar muito bem e quando faz algo que não deveria não tem medo de nos contar. Ela também aprendeu muito sobre os sentimentos dela e tem facilidade para se autorregular quando é preciso”, diz Evelyn.
Para Gabriela, a capacidade da filha de se colocar no lugar do outro foi uma das vitórias colhidas. “Eu realmente tenho uma criança empática, que tem um senso e um respeito com o próximo que é surreal. Ela criou também uma autonomia relativamente boa. É uma criança super pertencente. Sabe o que quer e o que não quer, e isso eu não acho de todo ruim.”

Foto de Letícia Moreira / Folhapress. (Evelyn Faoyh compartilhou nas redes sociais os frutos negativos que colheu após aplicar a educação positiva com a filha. (link da Folha de SP acima).