Poucos se lembraram da data, afinal, ela não é tão significativa. Exceto para a Ford e seus envolvidos. Num ímpeto empreendedorista, a empresa decidiu, há 80 anos, aceitar uma propriedade de terra doada pelo Governo do Pará no meio da Floresta Amazônica, a fim de construir uma cidade industrial, tendo como objetivo maior, produzir borracha para sua produção automobilística. Entretanto, por diversos motivos, a empreitada fracassou e o que era para ser uma cidade planejada na mata, tornou-se o vilarejo de Belmonte.
Extraído de: http://blogriobranco.wordpress.com/2008/06/
Artigo escrito por Ali Chams, Camila guirado Abolis, Cintia Almeida, Flávia Araújo e Domingos Vela, 5ª etapa do curso de Relações Internacionais das Faculdades Integradas Rio Branco para a matéria Comércio Exterior II.
FORDLÂNDIA
Como parte de seus projetos, Henry iniciou a chamada Integração Vertical, que consistia no controle de todos os recursos necessários à construção de um bem. Para se libertar do monopólio inglês do látex e suprir a necessidade de borracha, matéria-prima complementar para a fabricação de automóveis, Ford decidiu ele mesmo produzir a tão essencial matéria prima e assim começou a prospecção de locais para a produção de látex e para isso contratou o brasileiro Jorge Dumont Villares e William L. Schurtz que negociaram com o governo do Pará para que lhes doasse uma área de um milhão de hectares nas margens do Rio Tapajós para a construção do empreendimento e eles em seguida a venderam para Ford pelo valor de US$125 mil dólares, ou seja, a aventura de Ford já mostrava indícios de um fracasso. Em 1927, foi estabelecido um vilarejo chamado Fordlândia.
Fordlândia contava com uma excelente estrutura: hospital de primeira linha (onde foi realizado o primeiro transplante de pele do país), luz elétrica, água encanada e filtrada, sistema de hidrantes, cinema, um porto, entre outros, lá ele construiu a maior serraria da América Latina que a princípio tentou vender a madeira, vinda do desmatamento, para os EUA e Europa para tentar obter algum retorno do seu investimento, mas o negócio logo se mostrou inviável. Ford tentou construir uma comunidade “American-as-apple-pie”, uma representação do “american way of life”. No vilarejo havia mais de 3 mil funcionários, onde mais de 20 diferentes línguas eram faladas, na cidade havia desde padeiros e açougueiros a uma pequena fábrica de calçados, vários americanos foram chamados para a cidade e foram eles os únicos a ocupar os cargos de chefia.
O empreendimento de Ford tomou como modelo o empreendimento inglês nas suas colônias na Malásia. Mas em 1876, o inglês Henry Alexander Wickham do Royal Botanical Garden em Londres, que morou em Santarém durante dois anos, colheu 70 mil sementes de seringueira (Hevea brasiliensis), originárias de uma região denominada Boim, no Vale do Tapajós, e as transformou em mudas que plantou em colônias britânicas na Malásia, formando extensos seringais de cultivo que apresentavam alta produtividade de borracha seca por hectare.
Se de meados do século XIX até quase meados do século XX praticamente toda borracha natural consumida no mundo era originária da Amazônia brasileira, levando o produto a competir com o café na formação do PIB do Brasil, em pouco mais de cinqüenta anos os ingleses desbancaram a Amazônia e transformaram-se nos maiores produtores de borracha do mundo, com efeitos desastrosos para a economia da região amazonense que continuava assentada no extrativismo predatório dos seringais nativos, e assim continuou por mais meio século.
Esse fato teve reflexos também em Dearborn, – fábrica de Ford onde eram produzidos 1.200 automóveis por dia e eram empregados 100.000 trabalhadores – pois os ingleses a fim de manterem o preço da borracha em alta, passaram a controlar a produção asiática, obrigando Henry Ford a pensar em produzir sua própria matéria prima se quisesse ter garantia no abastecimento de látex para a fabricação dos pneus dos seus automóveis.
Assim surgiu a idéia de Ford produzir borracha na Amazônia, a escolha do Vale do Tapajós para sede do seringal racional deveu-se ao fato de lá ter saído as 70 mil sementes que Henry A. Wickham levou para Londres e de onde até pouco tempo atrás era produzida quase a totalidade do látex usado no mundo.
Apesar do investimento de Ford se justificar por criar uma segurança no fornecimento de látex a sua implementação sofreu de sérios problemas e principalmente de erros. Em primeiro lugar a escolha do terreno, os um milhão de hectares “concedidos” pelo governo do Pará nas margens do Rio Tapajós era de uma topografia montanhosa e solo predominantemente arenoso que dificultavam o cultivo com máquinas, elevando o custo de produção da borracha. Aliado ao clima com umidade relativa do ar elevada, que favorecia o ataque do inimigo número um da seringueira na Amazônia, o “Mal das Folhas”, doença causada pelo fungo Microcyclus ulei, até então desconhecido dos americanos de Fordlândia que não estavam preparados para combatê-lo. Em segundo lugar, foi a equipe mandada para realizar a tarefa, na equipe mandada por Ford para a criação da cidade e da plantation de seringueiras era constituída por engenheiros, médicos, contabilistas, eletricistas, desenhistas, mas nenhum agrônomo, botânico ou fitotecnista fazia parte da equipe inicial, ou seja para Ford uma vez que sua plantation seria feita na região nativa da seringueira não haveria problemas com sua implementação. O terceiro erro foi resultado do segundo, uma vez que na equipe técnica não havia ninguém especializado no cultivo de seringueiras e com a idéia de que por estarem na área nativa da seringueira a forma como elas seriam plantadas não traria problema algum, assim com o objetivo de “industrializar” a produção de látex as seringueiras foram plantadas em fileiras, 200 mudas por acre num total de 1.5 milhão de seringueiras – dentro da floresta as seringueiras eram encontras numa área de 3 seringueiras por acre- e poucas mudas vingarem exatamente por estarem umas muito próxima das outras, onde cada uma inibia o crescimento da outra, e por estarem em um solo pobre e montanhoso.O quarto ponto foi que uma vez que o terreno era úmido demais, as seringueiras ficaram mais vulneráveis a ocorrência de fungos e foi exatamente isso que dizimou o resto da plantação, o fungo Mycrocyclus ulei, popularmente conhecido como “mal das folhas”. O quinto e último problema foi exatamente o choque cultural, ao conceber a idéia de plantation Ford queria também exportar o estilo de vida e os valores americanos, o “healthy lifestile”, então construiu casas no estilo americano, o regime de trabalho era próprio americano de “nine-to-five shifts” ao contrário do eu os caboclos eram acostumados (antes do sol nascer com pausa até o sol se pôr para evitar o sol amazonense), o próprio entretenimento era “importado”, os trabalhadores eram obrigados a celebrar as festividades americanas, nos finais de semana eles eram chamados a reuniões onde liam poesia, dançavam e cantavam canções típicas americanas, outro ponto foi que Ford proibira o consumo e venda de bebidas alcoólicas na cidade, obrigando o caboclo a irem para outras cidades para se saciarem. O ponto de ebulição desse choque foi quando Ford trocou a refeição comum aos caboclos, peixe e farinha, por comidas americanas, como hambúrguer, espinafre e outro. Isso tudo eclodiu na “revolta das panelas”, revolta essa que perdurou por 3 dias até que o exército brasileiro viesse para intervir na região.
A aventura de Henry Ford durou menos de 20 anos, exatamente pelos problemas citados acima. Logo após que a Fordlândia não vingaria exatamente pela sua topografia, Ford tentou mudar o empreendimento para a cidade de Belterra, contratando o especialista James R. Weir para diagnosticar e implementar a nova plantação, mas a mesma foi também dizimada pelo “Mal das Folhas”. No entanto, a aventura de Ford foi abandonada com o surgimento da borracha sintética, derivada do petróleo e gás que tornou a obtenção do látex de seringueira economicamente inviável. Em 1945 a filial amazônica da Ford Motor Company fechou as portas, levando consigo um prejuízo de mais de US$ 100 milhões em valores atualizados.
