Interpretando a Interpretação

Confesso que não agüento mais ouvir a discussão nas rádios, jornais ou TV, sobre os lances polêmicos do jogo São Paulo X Corinthians com o Sálvio Spínola. Ouve-se de tudo! Comentários de especialistas e de leigos, alguns com lógica e outros ilógicos, expressões inteligentes e impressões absurdas.
Por alto, sem critério metodológico, creio que o que mais ouvi é que tudo isso é culpa da interpretação. Mas o que é interpretação?
A interpretação no futebol nada mais é do que a capacidade facultada ao árbitro de analisar um lance e tomar decisões. Quanto mais polêmico o lance, mais polêmica a decisão. Entretanto, a mesma deve ocorrer em um piscar de olhos. Às vezes, 1 segundo é um tempo precioso para se tomar uma decisão. Aí entra o “erro de fato” e o “erro de direito”. Erro de fato é aquele que você interpretou um lance, tomou a decisão, e posteriormente observou que era absurda sua marcação. Ex: A mão na bola ou bola na mão. Pôs a mão ou bateu na mão… Já o erro de direito é aquele que se caracteriza pelo desconhecimento da regra. Ou seja: a bola foi recuada para um goleiro por um companheiro de time e o árbitro esqueceu-se de que isso não podia. Na prática, o erro de direito permite anulação do jogo, pois é um “direito”. O erro de fato não, pois houve interpretação naquele fato momentâneo. Ambos não caracterizam dolo intencional.
Feita a introdução, me admiro em ver como a polêmica tomou corpo. É claro que é um clássico, é evidente que num Majestoso (a quanto tempo não se refere a este jogo pelo seu apelido) traz muita repercussão, mas erros como esses (se considerarmos como erro, não o estou aqui fazendo) acontecem com freqüência. E são erros inerentes do futebol, da sua natureza. Alguns passam desapercebidos, outros são mais claros. Em uma partida com inúmeras câmeras, é normal que eles sejam destacados. O que não se pode é creditar má-fé. Por qual motivo o árbitro agiria assim? Qual a intenção? São 2 equipes grandes e tradicionais.
Quanto ao lance em si, e por minha posição como árbitro profissional da FPF, colega do Sálvio e conhecedor dos meandros da arbitragem, não me encontro em posição confortável para comentar tais lances. Seria cômodo usar a desculpa da ética para não me comprometer, ou ainda praticar o proselitismo em torno da categoria. Mas ousarei usar o Fair Play para dizer que faço valer a resposta batida, mas adequada, de que os lances são interpretativos. Se a minha interpretação seria a mesma do Sálvio? Aí já é outra história…
Em tempo: não se pode execrar um árbitro por uma partida. Às vezes, acorda-se num dia ruim, tudo dá errado e frusta-se uma expectativa. E aqui lembro-me de certa vez, em 2004, quando estávamos em pré-temporada para o Paulistão daquele ano, que o árbitro Cléber Abade disse, após realizarmos uma atividade de interpretação de lances (eram 30 jogadas polêmicas): aqui acertei e errei, mas na minha casa, no meu sofá, com minha televisão e controle remoto, não erro um só! Ou seja, a comodidade de alguns críticos também é exagerada, pois sem dó nem piedade rechaçam qualquer argumentação.

A interpretação do árbitro é maior subjetividade do futebol atual. Sinceramente, não sei se isso é bom ou ruim. Mas sei que torna o futebol mais gostoso, “vendável” e popular.

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