Eu tenho muita preocupação quando ouço pessoas falando que a “Profissionalização da Arbitragem de Futebol” resolverá o problema da baixíssima qualidade técnica que vivemos atualmente. Alguns o fazem pela empolgação, outros pela ingenuidade.
Não vai resolver a maior parte das pendengas que temos. Profissionalizar é um pequeno passo para melhorias, onde os árbitros terão mais segurança financeira (não que eles ganhem pouco, mas sim que estarão blindados de, se por ventura tiverem algum evento que os impeça de apitar e ficarem sem receitas, não estarem reféns das taxas de jogos).
Para você entender didaticamente sobre o que é “Profissionalizar a Arbitragem”, em seus Direitos e Obrigações, falamos em outra oportunidade nesse post: https://professorrafaelporcari.com/2025/10/13/afinal-o-que-e-profissionalizar-os-arbitros-2/
As grandes questões residem em três ítens: o Modelo de Profissionalização, a Orientação de quem os cobrará e a Independência da Comissão de Arbitragem:
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- Modelo:
Circulou tempos atrás a ideia de que uma empresa poderia agregar os árbitros, e, como se fosse uma cooperativa, prestar serviços à CBF. Uma terceirização, como disfarçadamente um dia fez a FPF ao incentivar a criação da COAFESP (uma associação de árbitros), rivalizando politicamente com o SAFESP (que era o sindicato, que atuava como cooperativa). Naquela oportunidade, os árbitros iludiram-se de que algo poderia acontecer, e nada mudou. Os nomes dos dirigentes eram os mesmos, apenas de lados diferentes, e tudo voltou-se ao normal anos depois.
Não sejamos puros demais e achemos que a CBF vai registrar os árbitros na CTPS, que terão FGTS e INSS e se recolherá PIS e COFINS. Nenhum vínculo empregatício ou alusão à CLT. Serão, provavelmente, prestadores de serviços autônomos, criando suas empresas e emitindo NF mensalmente para a CBF os pagar. A diferença é que terão um contrato de trabalho por um ano, renovável ou não baseado no desempenho, com valores mínimos de recebimento como salário, acrescido por número de jogos apitados. Exclua-se VAR, AVAR e bandeiras, pois em um primeiro momento, a CBF não os quer nesse modelo.
Dessa forma, ficará a grande discussão: o árbitro (que terá que se dedicar durante a semana aos treinos, atualizações de regras e outros preparos) terá em contrato a exigência da dedicação exclusiva? Afinal, hoje se ganha muito dinheiro em eventos festivos, jogos varzeanos bancados por prefeituras e outras atividades na folga que o remuneram muito. Neles, são celebridades, dão autógrafos e viram “pop-star” por um dia (se você não conhece essa realidade, vide aqui: https://professorrafaelporcari.com/2025/10/11/na-varzea-um-arbitro-pode-ganhar-mais-do-que-um-profissional/).
Se ele não for remunerado a contento, vale a pena assinar um contrato profissional de prestador de serviço à CBF, ou financeiramente será melhor permanecer como está? Aguardemos os valores sugeridos pela CBF.
2. Orientação:
Não adianta ter um árbitro fisicamente bem, sem trabalho paralelo, se os homens que os orientam nada sabem. Reflita: se existe a orientação de movimento antinatural da mão na bola (que é mal aplicada no Brasil), e os instrutores continuam a orientar que “para tudo deve se marcar’, do que valeu profissionalizar quem apita?
A qualidade dos orientadores, instrutores e até dos “aspones” que habitam na CBF é duvidosa. Muitos lances mal apitados no Brasileirão não são frutos de erro de interpretação, mas de orientação equivocada (especialmente: marcação de faltas e contato físico em disputa de bola).
3. Independência:
A mim, parece piada: quer dizer que um quadro profissional seria imune a erros, vetos e instrumentos políticos?Ramon Abatti Abel cometeu um erro bizarro e foi para a geladeira (e iria do mesmo jeito se fosse profissional). A atual farra dos escudos FIFA por acordos políticos e escalas de árbitros de estados variados (não por meritocracia) vai deixar de acontecer? Não vai…
A pressão dos cartolas na Comissão de Arbitragem, o aceite das suas reclamações e malabarismos para justificar lances errados como corretos, continuará da mesma forma.
Enfim, reforço o que disse anteriormente: a Profissionalização não resolverá os problemas. Ela será apenas um primeiro passo e cercado da pergunta inicial: como será esse modelo?
Aguardemos. Não creio que em Janeiro de 2026 nós o teremos (até porque, se tivéssemos, seria feito “às coxas”, apenas para dar uma satisfação pública).
